Operadoras de satélite criticam Anatel e inclusão da
banda C estendida no leilão da 5G

 

As operadoras de satélites aproveitaram a consulta pública da Anatel sobre o leilão da 5G para questionar a falta de estudos conclusivos realizados pela agência para a liberação da banda C estendida. Conforme a contribuição do Sindisat, o sindicato das empresas do segmento, a proposta de liberar o espectro entre 3,625 e 3,7 GHz exige mais discussão e, portanto, requer que o leilão seja adiado.

Para o sindicato, estudos realizados até o momento em laboratório, e que demonstraram formas de sanar a interferência do IMT (telefonia móvel) sobre serviços de satélite em banda C, não tiveram a profundidade necessária.

O Sindisat usou a consulta pública para informar a Anatel de que contratou uma consultoria para realizar estudos técnicos próprios sobre o tema. E pediu que a agência, por isso, aguarde 90 dias antes de liberar o leilão, tempo necessário para a conclusão do trabalho.

Novidade
Para o sindicato, a inclusão na minuta do edital da banda C estendida foi uma novidade, uma vez que as discussões conduzidas pela Anatel não previram tal modelo. “Entre o nascimento do processo na Superintendência de Planejamento e Regulamentação em princípios de 2018 e a reunião do Conselho Diretor que decidiu incluir tal faixa no escopo da futura licitação, em fevereiro de 2020, apenas às vésperas da derradeira reunião do Conselho Diretor foi informada ao setor satelital a intenção de compreender estes 100 MHz”, argumentou a entidade.

Por isso, ressalta que os estudos de interferência feitos até então previam a destinação das frequências entre 3,3 GHz e 3,6 GHz. “Realce-se que esta agência promoveu a Consulta Pública nº 43/2018, que culminou com a edição da Resolução 711/2019, cujo objeto se voltou exatamente a limpar faixas para essa licitação. E ao fazê-lo não incluiu as faixas entre 3.600 e 3.700 MHz”, frisa.

AIR
Além da falta de um estudo técnico, falta uma análise de impacto regulatório (AIR) quanto à licitação da banda C estendida. “O próprio processo carece de documentação e fundamentação para a inclusão desta faixa no certame, notadamente pela inexistência de uma Análise de Impacto Regulatório que aborde as consequências da inclusão desses 100 MHz adicionais no leilão e que mapeie seus impactos e enderecem de forma correta e justa suas consequências”, diz a contribuição à consulta, assinada pelo presidente da entidade, Luiz Otavio Prates.

Ele acusa a agência de mudança em suas práticas ao longo do processo de elaboração da minuta do leilão da 5G. “A comparação entre o que se viu no presente processo e o que consta dos autos do processo nº 53500.060856/2017-16, em especial no documento SEI 2518596 revela uma abissal diferença no modo como procedeu esta agência”, diz, remetendo ao processo de elaboração do edital e ao de estudo para a liberação do espectro de 3,5 GHz. A Hispamar, que também enviou extensa contribuição, aponta a mesma mudança de postura por parte da agência.

Em resumo, o Sindisat reclama, assim, que sem uma AIR, o leilão não teria legitimidade para ser realizado. Por ser prevista nos regulamentos internos da agência, a ausência da análise para a inclusão dos 100 MHz adicionais da banda C estendida, e não ter sido feita, haveria forte “insegurança jurídica”.

WRC-19
A contribuição do Sindisat bate na tecla de que a inclusão foi tardia e procura mostrar como, até a deliberação do conselho diretor da Anatel que aprovou a minuto, não havia previsão das autoridades brasileiras para usar a banda C estendida na 5G.

“Na WRC-19, a administração brasileira teve a oportunidade e a prerrogativa de manifestar-se neste sentido (de identificação de referida banda para o IMT) e não o fez, o que justifica ainda mais a surpresa e o estranhamento diante da rapidez com que a faixa acabou sendo incluída”, critica Prates. E alega, ainda, que meses antes de colocar a minuta do leilão em consulta, a agência realizou consulta pública sobre outorga de novos direitos de exploração de satélite que previa a banda C estendida.

Indenizações
Há ainda a questão das indenizações às empresas de satélites. A minuta do leilão diz que estas receberão de volta os preços pagos pelos direitos de exploração da frequência. Muito pouco, na opinião do sindicato, pois deixa de lado o investimento feito pelas empresas para construir e lançar os satélites que ocupam a faixa, por exemplo.

“A Anatel tem todo o conhecimento e o instrumental para chegar a critérios corretos de indenização pelos custos, pelo capital investido e pelas efetivas perdas a serem sofridas”, dizem. E lembram, também que os prazos para a limpeza devem ser “razoáveis”.

Por fim, pede que o edital do leilão, caso inclua a banda C estendida, traga os valores de indenização para cada empresa de satélite que esteja hoje ocupando a faixa, apresente as soluções que serão adotadas para a mitigação da interferência na receptação da TVRO e outras soluções para garantir a convivência dos serviços satelitais com o IMT.

Backhaul
O setor também cobra mudança na minuta no que se refere ao cumprimento dos compromisso de construção de backhaul. Afirma que não apenas a fibra óptica deve ser usada, uma vez que o Brasil tem dimensões continentais e cidades em que a chegada da fibra é difícil.

Para prever esses casos, alegam, o edital deve ser tecnologicamente neutro. “Entendemos descabido impor este tipo de obrigação [construção de backhaul em fibra], tendo a tecnologia satelital já se mostrado eficiente para complementar as redes terrestres “.

Intelsat
As operadoras de satélite também enviaram suas contribuições avulsas. A Intelsat, em sua participação, afirma que a destinação de 300 MHz para as operadoras móveis é mais que suficiente para a exploração da 5G no Brasil, uma vez que o mercado está prestes a ver uma consolidação. Com isso, em nível nacional, o Brasil passaria a ter três operadoras móveis.

“Para três participantes nacionais, um resultado provável com 300 MHz de espectro é que os três MNOs nacionais garantirão cada um 80-100 MHz em todo o país”, calcula. E embora as operadoras móveis queiram mais espectro, a satelital diz que não existem aplicativos que demandem a velocidade máxima conseguida com 100 MHz de espectro em banda média usado numa rede 5G. Para a empresa, 40 MHz são mais que suficientes para a entrega de um serviço 5G de qualidade.

E remete à contribuição da Nokia, que lembrou que não existem portadoras maiores que 100 MHz, mais que isso resulta em ineficiência espectral. “Não esperamos que nenhum MNO no Brasil tenha um caso de negócio substancial para oferecer mais de 100 MHz de espectro de Banda C. Os ganhos no pico de velocidade teórico de uma rede e na qualidade de 5G, no entanto, param em 100 MHz”, afirma. Além disso, ressalta que as teles ainda poderão fazer o refarm do espectro que hoje usam em 2G, 3G e 4G.

A empresa também reclama da falta de clareza sobre aspectos técnicos que a permitam calcular o potencial de interferência em serviços fixos satelitais (FSS), bem como a falta de uma banda de guarda. “Até o momento, a Intelsat não tem conhecimento de nenhum teste concluído pela Anatel para avaliar a proteção necessária das estações FSS em faixas de frequência adjacentes aos sistemas móveis terrestres 5G na faixa de 3.600 a 3.700 MHz”.

Telesat
Mais sucinta, a canadense Telesat sugeriu que a Anatel preveja uma banda de guarda de 20 MHz entre as frequências de 3,680 GHz e 3,7 GHz para prevenir interferências entre bandas adjacentes. Cobra a atribuição de responsabilidade das vencedoras do leilão em implementar filtros nas estações de satélite profissionais na banda C.

“A adoção de uma banda de guarda na faixa 3.680-3.700 MHz e a responsabilização das proponentes vencedoras de determinados lotes de frequência na licitação de 5G, tal qual definido pela Agência, pela implementação dos filtros nas estações de satélite profissionais operativas na faixa 3.700-4.200 MHz, contribuirão para o pleno sucesso da licitação 5G, na medida em que assegurarão a integridade dos serviços fixos por satélite”.

SES
A SES também reclama do edital, especialmente quanto à metodologia do cálculo do ressarcimento das operadoras satelitais que abrirão mão da banda C estendida, que considera “insuficiente” e uma “ameaça” aos direitos das operadoras de satélite.

“O ressarcimento deve contemplar não somente o preço público pago pela autorização, na proporção do prazo remanescente da autorização em relação ao total de banda autorizada, mas também, e principalmente, os investimentos feitos pelas operadoras em configuração, lançamento e disponibilização da capacidade satelital que será perdida por força da mudança de destinação e, além disso, abranger todos os custos operacionais que serão impostos aos operadores para a limpeza das faixas, tais como custos com a migração de clientes, desmobilização ou mobilização de fornecedores, rescisões contratuais de clientes, perdas de oportunidades de receita para estes investimentos conforme os planos de negócio apresentados para cada satélite, etc”.

A SES propõe, ainda, uma solução como a aplicada nos Estados Unidos, em que o regulador local se dispôs a pagar um adicional às operadoras satelitais que disponibilizarem mais rapidamente o espectro da banda C para as operadoras móveis. “A metodologia de preço deveria considerar ainda o valor econômico para as vencedoras do certame assim como para a própria sociedade brasileira de uma possível aceleração na desocupação da faixa de espectro e desta forma apresentar valores de incentivo às operadoras satélite para adotarem um plano de aceleração”, conclui a SES.

Fonte: Telesintese, escrita por Rafael Bucco
imagem: Banco de Imagens

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